Palavras rebuscadas para um dizer corpo: confrarias da memória (uma escrita homenagem a Confraria da Dança, 2020)
Palavras rebuscadas para um dizer corpo: confrarias da memória
à querida Diane Ichimaru
ao querido Marcelo Rodrigues
à Confraria da Dança
Universo sem fim... memórias que se acumulam no corpo. Memórias do outro memórias de mim. Cheiro flores e pontuações desarrimadas. Ecos de um eu tão distante e tão perto de se perceber. Poesia que ecoa da boca e suor de palavras alvoroçadas. Coração bate e o corpo acelera-se em desatino. Clavículas saltitantes, carnavais mirabolantes, corpo a brincar insistentemente numa vontade de existir que expele um mundo inebriante. Salto entre parábolas desajeitadas para voltar ao sentido inebriante da sonoridade dançada pela Confraria da Dança. Um choro-grito-úmido do corpo retorcido a adentrar o palco (Pauta para que neste momento eu possa lembrar dessa gestualidade – imaginário destilado). Voo por memórias enraizadas nas paragens do corpo. Cartas e cantigas que esvoaçam pelo espaço adentro. Máquina, cozinha, cozer das musculaturas, veios do corpo, ranhuras dos pés de tecem danças inebriantes tal qual um colibri embebido de seus doces néctares. Tal qual um jatobá a florir roxeando a primavera de alegrias fortuitas. O coração acelera para quando volto para casa, para o chão do qual somos feitos. Uma espiral. Dobra. Curva. Volta ao rumo destino. Voltar a Confrarias em palavras rebuscadas é voltar ao corpo-casa, memória que me constitui. Desde os primeiros instintos de querer dançar ato-me a história dançante de duo imperioso. Pássaros que contagiam a cena coreográfica com ferocidade, animalidade, alma (alma-corpo). Diane e Marcelo, flores expostas na história do corpo de tantos, dos percursos formativos que instauram percursos. Linhas que costuram caminhos diversos, impares, singulares, plurais. O eu a costurar destinos entremeando o espaço com cada parte do corpo. Em 2006 tive a oportunidade de ser selecionado na Oficina-Montagem na Estação Cultura, em Campinas. De lá pra cá, tantas histórias constituíram-se corpo. Alimento do corpo em formação concomitante ao curso de graduação em Dança na Unicamp para que pudesse fortalecer um rumo e resistir aos percalços de um caminho hegemônico. Desconstrói em construção na poesia, no rigor, do desejo, nas inquietações, descobertas, cansaços, angustias dentre tantas contrariedades que a vida nos impõe. Corpo exposto ao universo adverso. da cena, da criação e das pedagogias efêmeras, não sistematizadas. A poesia da dança no espaço como uma santa que desaparece e rodopia entre desejos juvenis. A Confraria continua provocando o corpo que hoje sou e volto a ela nessas linhas rebuscadas de um apaixonado por cada movimento que dali ecoa. Um modo de vida a enunciar mundos possíveis, distantes do senso comum. Tantos alinhavos entre chá de jasmim e queijo com goiabada que o corpo dança mesmo quando não quer dançar. Dança a todo instante como a Ave Raiz – Guyrá Apó que se colocou a dançar nesse redor, um espetáculo tecido pelo corpo que se movimentou entre histórias de vida, oralidades, causos, festas, sonoridades, encruzilhadas nas cantigas-pássaros e no olhar da direção artesanal que Diane Ichimaru desenhou. Costuram que emaranháramos figurinos e a produção e pesquisa sonora de Marcelo Rodrigues. Voltei a casa para aprofundar raízes e dali poder saltar, voar um pouco além. Nessa trajetória constituída de muito corpo-ardor adensa o sentido da arte e, principalmente, da dança na contemporaneidade a licença histórias diversas que pairam nos cenários culturais de uma cidade e tateiam sempre, outros territórios. Uma Dança-Confraria pungente que vai espiralando uma história de dança no brasil, uma dança brasileira que se assenta em identidades transitórias e que se propõe ser formativa e transgressora na força artesanal ecoada pelo corpo dançante.
Daniel Santos Costa
22/11/2020
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